terça-feira, 12 de maio de 2009

O elefante sem patas

No horizonte longínquo já se avistam os primeiros raios madrugadores que desde cedo começam a labutar nas efémeras ondulações de areia granulada. Avisto, ao longe, um elefante negro a esboçar um sorriso saído directamente da tromba enrrugada situada na extremidade longínqua do membro exterior. As patas bamboleiam lentamente sob o ar denso que atravessa os meandros das suas unhas grosseiras e ligeiramente afiadas. Caminha vagaroso pelo deserto sub-africano do continente espesso e levanta, de vez em vez, o rabo para se inteirar do que se passa atrás de si.Assusta-se repentinamente com o toque lívido de uma cobra verde-água que serpenteia o areal mascavado e estilhaçado pela aragem.

- Boa tarde, Srª. Cobra! Como tem passado? - questionou curioso o pesado bicho.
- Ora, Ora... Estou muito bem, obrigada. E o Sr., como se tem aguentado com tanto calor? Este ar quente não perdoa os membros inferiores de nenhum animal, não é verdade?
- Ai, nem me fale nisso. Fui forçado a amputar as patas... Pensei que tivesse reparado nisso no preciso instante em que o meu coto e a sua pelagem ácida tiveram um encontro memoravelmente assustadiço da minha parte.
- Mas como aconteceu esse terrível acontecimento? - perguntou a cobra, sem conseguir disfarçar a sua incomensuravel curiosidade.

O elefante negro, claro, ávido por contar a sua história, ergueu com firmeza as rugas do tronco lugúbre, endireitou a garganta com uma tosse forçada e pestanejou duas vezes dando ênfase aos olhos repentinamente brilhantes.

- Bem sabe como gosto de me esfregar nos prazeres do pantâno. Aquele que... você sabe do que estou a falar...
- Se sei... - disse receosa a cobra baixando o olhar.
- Comecei a sentir os primeiros sintomas há uma semana. Seria inimaginável pensar que por cada vez que respirasse as minhas patas aumentassem de tamanho. Ainda consegui a proeza de não respirar durante um bom período de tempo mas logo fui apanhado despercebido por uma brisa vadia que, veja só a minha má sorte, me fez espirrar incessantemente. Entre um espirro e outro era obrigado a abrir os pulmões com uma longa inspiração. Sempre assim... entre um espirro e outro... repirava longamente.

Enquanto o elefante contava a trágica notícia, a cobra contorcia-se angustiada, iniciando um processo lento de escamação. De seguida começou a agir de forma descontrolada, um acto que infelizmente deixou transparecer o seu estado de histerismo interior.

- E pronto.... O resto da história a Srª. Cobra já deve ter calculado como se orquestrou. Quanto mais espirrava mais as minhas patas inchavam. Um espirro correspondia a um centímentro rápido de crescimento e... PUF!!! Repuchadas, as minhas patas não aguentaram a pressão e rebentaram.

O elefante despediu-se da Srª. Cobra e seguiu caminho. Continuava triste por a sua curiosidade lhe ter roubado as patas.

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