segunda-feira, 28 de setembro de 2009

O sofá perfeito

O Meia-Cuca nem quer acreditar. Será possível um homem de meia-idade, com meia cabeça e meio coração, receber em casa o sofá que pertencia ao seu tetravô em pleno mês de Agosto? Quando a campainha tocou, o Meia-Cuca ainda estava vestido com o fato do trabalho, pesado e quente. “Quem é?” perguntou, encalorado. “Encomenda para o Sr. Meia-Cuca”, ouviu-se do outro lado. Pediu-lhe que assinasse uns papéis amarelos, dando-lhe de seguida a carta amarrotada pelos serviços postais. O carteiro lamentou o sucedido e o Meia-Cuca fechou-lhe a porta pensativo. “Ora esta... Quem diria... O sofá do meu tetravô. Só é pena não combinar com a mobília da sala. Lixo, está dito!”. Apressou-se a deixar o sofá ao lado do caixote do lixo e voltou para dentro. Só quando se sentou na sua poltrona, uma aparatosa cadeira de pele negra, é que o Meia-Cuca se lembrou da carta esquecida em cima do frigorífico.
“Olá Meia-Cuca. Como tens passado? Escrevo bastante entusiasmada por saber que o último desejo do teu tetravô cumpriu-se finalmente. Já não era sem tempo, aliás... Mas as burocracias da herança atrasaram a entrega. Espero gostes da surpresa.
Um beijinho da bisavó Clotilde!”´
O Meia-Cuca nem quer acreditar. Além da dor de consciência por se ter livrado daquele sofá hediondo, sente agora pena pela bisavó Clotilde que sempre foi uma pessoa bastante prestável. Levantou-se do cadeirão, num ápice, e saiu porta fora. Receava que algum vagabundo, filho de ninguém, se apoderasse do sofá que abandonara há minutos. Contudo, o sofá continuava no mesmo sítio. Intocável. Intacto. Incólume. A custo pegou no sofá encardido e transportou-o novamente para cima. Primeiro pensou colocá-lo junto à janela, depois ao lado do móvel da televisão e ainda encostado à parede mestra. Não conseguia decidir. Já era tarde e o Meia-Cuca estava exausto. "Vou dormir. Amanhã logo se vê."
(continua)

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